“The House That Jack Built” é uma reflexão sobre como a morte e a violência são representadas na arte

Este é um dos filmes mais antecipados do ano e, provavelmente, também um dos melhores. Nesta obra, Lars von Trier apresenta a história de Jack (Matt Dillon), um engenheiro que desejava ser arquiteto e que também tem um gosto especial por matar pessoas.

Seguindo uma estrutura episódica a que o realizador já nos habituou em filmes anteriores, assistimos a alguns “incidentes” escolhidos pelo protagonista e que fazem parte da sua carreira como serial killer.

Nos primeiros é retratado um personagem que funciona como caricatura e que faz os espectadores do Leffest rir compulsivamente enquanto este se debate com o seu transtorno obsessivo-compulsivo. Além disso, é tão desastrado neste novo “emprego” que criou para si próprio, que é fácil a audiência se relacionar com ele. Este é um personagem que “parece um serial killer”, tal como afirma a personagem interpretada por Uma Thurman, mas que tem os mesmos problemas de adaptação a situações inesperadas como talvez a maior das pessoas que, desconfortavelmente sentadas, decidiram assistir a este desfile de morte, sofrimento e sangue até ao final.

A violência, elemento essencial num filme deste autor dinamarquês, parece não conhecer barreiras e, apesar dos momentos em que nos é apresentada a execução final das vítimas serem de curta duração, todos estes são mostrados várias vezes ao longo do filme. Esta opção serve, talvez, como forma de afirmar que, apesar de dolorosos, são importantes como recordação da sua arte, que é o tema principal das reflexões feitas com Verge (Bruno Ganz), o seu companheiro de viagem.

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Matt Dillon é um serial killer no mais recente filme de Lars von Trier, “The House That Jack Built”. Fotografia: IFC Films

Os preliminares que antecipam a morte são o aspeto a que o cineasta dedica mais tempo, criando longas cenas repletas de tensão e imagens grotescas. As expectativas são frequentemente invertidas, enquanto o espectador voyorista deseja tanto que o assassino consiga executar mais um incidente, como que a vítima se salve.

Neste universo parece que a justiça feita pela mão do homem não existe, e a sorte está sempre a favor do protagonista. (?)

Este é um caso feliz de como as imagens geradas por computador, quando bem executadas, podem servir a visão de um cineasta. As composições são extremamente cuidadas e com bastante atenção ao detalhe, o que tornou a experiência deste filme muito mais envolvente.

Acompanhada por música clássica e por “Fame”, de David Bowie, somos levados ao longo de duas horas e meia de duração pela sucessão de ideias vindas da mente de um realizador que não tem receio de arriscar, enquanto faz uso de todo o tempo que necessita. Mesmo que pareça que a violência apresentada neste filme serve apenas para conseguir o fator choque, este filme é muito mais do que isso, é uma reflexão sobre como a morte e, consequentemente, a violência são representadas na arte, e há espaço também para um meta-comentário.

No final de contas, Lars Von Trier, ao dar a Jack todos os elementos que este necessita para a construção da sua casa, consegue mostrar toda a sua maestria, ao criar esta obra prima, cheia de boas interpretações e momentos que serão certamente impossíveis de apagar da memória.


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